
Nem sempre é fácil de lidar com o inevitável confronto com a novidade. Por razões internas, subjacentes ao processo de maturação e desenvolvimento e, por razões externas, trazidas pelos desafios apresentados pela vida, as pessoas vão sendo confrontadas com sucessivos momentos em que sentem a necessidade de buscar novos conhecimentos e competências. Isso acontece porque as ferramentas até então utilizadas já não são suficientes para lidar com os novos problemas e situações. É nestes momentos que pode emergir a ansiedade relacionada com a necessidade de transformação pela insegurança causada pelo não domínio das modalidades de ação agora requisitadas.
Basicamente existem duas alternativas possíveis: abraçar os desafios e adquirir as necessárias e suficientes ferramentas para lidar de forma exitosa com os desafios ou, refugiar-se dos desafios adotando uma estratégia evitativa que, em primeira mão, garante segurança emocional. O que é necessário para adotar a primeira destas alternativas, claramente preferencial do ponto de vista da saúde mental, do bem-estar e, até, da felicidade.
Em primeiro lugar é conveniente a existência de uma perspetiva otimista que gera esperança na possibilidade de enfrentar os desafios, de alcançar êxito e, mais importante que o resto, de adquirir a aprendizagem necessária para aumentar os patamares de autonomia. Em segundo lugar, é importante conseguir uma atitude de iniciativa expressa na atividade intencional dirigida aos objetivos.
Porém, o desafio da novidade, traz muitas vezes sentimentos de insegurança sobre a esperança (confiança) e iniciativa (autonomia). Com ela surge a tentação das pessoas continuarem a utilizar as modalidades de resposta já aprendidas que, sendo familiares, são mais seguras de utilizar. Mesmo quando já não são claramente suficientes, essas ferramentas tendem a permanecer no repertório das pessoas na medida em que a organização de novas e distintas modalidades de resposta traz ansiedade.
A submissão a este tipo de medo e ansiedade conduz as pessoas para a utilização de um conjunto de estratégias ineficazes e prejudiciais ao seu desenvolvimento. A mais básica de todas elas é a estratégia evitativa que, embora traga uma proteção imediata, torna-se num obstáculo à aquisição da competência na medida em que a pessoa permanece incapaz de lidar com a situação desafiadora. Este comportamento fóbico não elimina o mal-estar sentido perante a situação e, até, reforça o sentimento de impotência da pessoa.
Uma outra estratégia prejudicial utilizada pelas pessoas é a desresponsabilização justificada com a falta de motivação, interesse ou, até, de competência, para lidarem com as novas situações encontrando a razão perfeita para a inércia. A formulação destes argumentos justificativos legitima o comportamento de não enfrentamento da situação e, inevitavelmente, reforça a ansiedade e a incapacidade para efetuar uma resposta adaptativa.
Outra estratégia utilizada é a de dramatizar a própria situação de ineficácia até que algum outro se disponha a resolver o problema da pessoa. Sucesso ilusório, pois a incapacidade para enfrentar a situação permanece.
Uma estratégia também utilizada por algumas pessoas é a de rejeitarem os novos objetivos em detrimento de outros mais familiares de maneira que o cardápio seja apenas composto por metas controláveis e quase garantidamente possíveis de alcançar. Ao fazê-lo, a pessoa garante um êxito para si próprio que é enganoso na medida em que representa estagnação mais do que progressão.
Abraçe os novos desafios com a certeza que não vai resolvê-los todos de forma simples e, à primeira tentativa. Algum fracasso é absolutamente normal pois essa é a história do desenvolvimento do homem, seja no plano filogenético, ontogenético, sociogenético ou microgenético. Enquanto espécie, grupo ou indivíduo, o homem contemporâneo expressa a capacidade de inovação dos seus antecessores. Caso tivessem sucumbido à ansiedade de se reinventarem não teriam feito a maravilhosa progressão do austrolopitecus ao homo sapiens.
Então, não passe ao lado das coisas para se permitir dizer que não tomou conhecimento delas arranjando uma maneira de legitimar o seu evitamento ou procrastinação. Não fique à espera que os outros resolvam os seus problemas pois é um êxito falacioso e prejudicial. Não fique a fazer as mesmas coisas, aquelas que já sabe de cor e salteado, pois esse sucesso não vai trazer competência. Aceite a sua vulnerabilidade e limitação e invista na capacidade de se modificar. Aceite a turbulência de enfrentar a ansiedade de se reinventar.
Mas, atenção. Não basta ler uns livros ou ver uns vídeos dos inúmeros gurus e mestres que pululam nas infindáveis ofertas hoje facilmente acessíveis. É necessário um auto-conhecimento aprofundado para saber, de fato, que vulnerabilidades temos, que potencialidades somos capazes de mobilizar, que estratégias são mais adequadas para cada um de nós. Entrar simplesmente no comboio das múltiplas receitas hoje disponibilizadas não basta para assegurar o desafio da transformação pessoal. Precisamos de fazer uma viagem suficientemente profunda de modo a encontrarmos significados e reconstruirmos sentidos. É nesse sentido que a psicoterapia, mais do que um espaço de intervenção na doença mental, está a transformar-se num espaço de desenvolvimento pessoal que pode dar um contributo importante na ansiosa tarefa da transformação.