Nas últimas décadas, técnicos de desporto, nutricionistas, médicos, psicólogos e até professores, têm-se unido em prol da prevenção alimentar e desportiva, destacando a importância de sermos activos no nosso dia-a-dia e de seguir orientações como a tabela nutricional e a tão famosa roda dos alimentos.
Porém, apesar de todos os esforços, as perturbações alimentares continuam a ser um tema central na discussão sobre saúde mental e física. O culto ao corpo perfeito, alimentado pelas redes sociais, influenciadores digitais e pela cultura do fitness têm alterado profundamente a relação das pessoas com a alimentação, o corpo e a auto-estima.
Perturbações Alimentares e o Ciclo Vicioso
Muitas vezes, a relação que temos com a comida vai além do simples prazer de comer. Quando essa relação se torna excessivamente focada na alimentação e na aparência, pode ser sinal de algo mais profundo: perturbações alimentares. Essas condições envolvem não só a comida, mas também os sentimentos, os pensamentos e até o modo como nos vemos.
Elas não surgem de um dia para o outro, mas são o resultado de uma combinação de factores sociais, culturais e pessoais, somados a uma auto-crítica intensa. Quem sofre com isso muitas vezes acredita que a aparência define o seu valor. Nesse contexto, o controlo sobre a alimentação torna-se uma forma de se afirmar, de sentir que ao menos uma parte da sua vida está sob controlo, especialmente quando tudo parece estar fora do lugar e dominado pela ansiedade.
Um pequeno deslize pode fazer com que a pessoa sinta que “fracassou”, o que leva a episódios de compulsão alimentar, seguidos de culpa e mais restrições, criando uma mentalidade de “Tudo ou Nada”, na qual acreditam que se quebraram a dieta, então é como se a única opção fosse comer sem parar, já que “tudo está perdido de qualquer forma”, além de que, podem sempre retomar e compensar amanhã.
Esse ciclo pode intensificar-se. O controlo vai ficando cada vez mais rígido, com a restrição a levar à compulsão, e a compulsão, por sua vez, a gerar ainda mais fome. Este ciclo alimenta comportamentos extremos, como o uso de laxantes ou vómitos, na tentativa de compensar o que foi ingerido. Isso cria uma falsa sensação de controlo e reforça a ideia de que é possível comer de tudo sem sofrer consequências – o que, no entanto, só aumenta a frustração e o sofrimento, perpetuando o ciclo.
As perturbações alimentares mais conhecidas, como a anorexia e a bulimia nervosa, envolvem obsessões com o peso e a imagem corporal. Isso leva a dietas extremamente restritivas e/ou a exercícios excessivos.
No universo dos ginásios e da busca pelo corpo perfeito, surgem outras condições, como a ortorexia (obsessão por uma alimentação “perfeita”) e a vigorexia (obsessão pela massa muscular), que embora mascaradas de saudáveis, acarretam um grande sofrimento psicológico, ansiedade e isolamento.
O Culto ao Corpo Perfeito
Na verdade, este conceito não é novo, mas ganhou proporções gigantescas, impulsionadas principalmente pelos media, redes sociais e influenciadores digitais que promovem padrões estéticos muitas vezes inalcançáveis e distorcidos. Este culto tornou-se particularmente forte entre os jovens, sendo o corpo idealizado não apenas um símbolo de beleza, mas também de sucesso, poder e auto-estima.
Padrões irreais – como a magreza extrema ou a musculatura exagerada – passaram a ser vistos como símbolos de status e valor pessoal. Com isso, muitas pessoas, especialmente os jovens, passam a acreditar que a felicidade e a aceitação social dependem de alcançar esse corpo ideal. Porém, esse paradoxo só cria um ciclo de insatisfação, prejudicando a saúde mental e emocional, gerando ansiedade, baixa auto-estima e distorção da imagem corporal, mesmo quando se aproximam do padrão desejado.
Esse culto ao corpo perfeito, essa busca incessante por um corpo ideal, ultrapassa os limites do cuidado saudável, levando a todos estes comportamentos prejudiciais, com práticas alimentares e técnicas de treino, mal definidas e desorganizadas. O mais grave é que tudo isso muitas vezes leva à perda de controlo sobre o que realmente importa para o seu bem-estar, acabando por se reduzir a um mero objecto estético.
A solução? Substituir o culto ao corpo perfeito pelo culto do corpo saudável, onde a diferença reside na motivação e no foco, ao invés de seguir padrões impostos pela cultura momentânea. Um corpo saudável vai muito além da aparência física e foca-se na eficiência e equilíbrio do organismo, promovendo a saúde física, emocional e mental.
A Influência das Redes Sociais
As redes sociais desempenham um papel significativo na perpetuação de padrões estéticos inalcançáveis. Influenciadores digitais, celebridades do fitness e posts de “corpos perfeitos”, frequentemente editados, criam comparações e padrões irreais que intensificam a insatisfação corporal. Isso contribui para o aumento de comportamentos alimentares extremos, à medida que as pessoas se tentam ajustar aos padrões de “beleza” promovidos online.
O Impacto na Saúde Mental
Assim, as perturbações alimentares não afectam apenas a saúde física, mas também têm um impacto significativo na saúde mental. No entanto, o impacto vai além da estética.
O nosso corpo precisa de energia para manter o nosso organismo em funcionamento e para fornecer alguma capacidade de trabalho externo realizado ao longo do dia. O que quer dizer que o nosso corpo em repouso continua a gastar energia, tendo cerca de 30% do consumo pelos músculos esqueléticos e outros 30% pelos músculos abdominais. O nosso cérebro consome cerca de 20% e o coração 10% da energia total. Assim, é fundamental um consumo acima do valor médio basal (em descanso) para garantir a saúde e a eficácia do nosso corpo. Chama-se a este processo metabolismo e aplica-se a todos os órgãos.
Nesse contexto, uma vez que o metabolismo cerebral é especialmente afectado por dietas restritivas e comportamentos alimentares extremos, o cérebro, que depende de nutrientes essenciais para o seu funcionamento adequado, sofre quando o corpo é privado desses nutrientes. Isso pode resultar em dificuldades cognitivas, como falta de concentração, dificuldade em tomar decisões, controlar impulsos e processar emoções, aumentando a tendência para a irritabilidade e depressão, já que o cérebro não recebe a quantidade de energia necessária para manter o equilíbrio emocional e mental, sobretudo com a resposta inerente de stress no cérebro.
Caminhos para a Prevenção e Tratamento
Procure saber o quão o seu comportamento compensatório é prejudicial à sua saúde e até mesmo aos seus objectivos. Aceite e entenda o que acontece no seu sistema, o que se passa consigo.
Promova uma Alimentação Equilibrada e Consciente
Muitas vezes, as pessoas pensam que para perder ou ganhar peso, basta cortar ou adicionar calorias de forma drástica. No entanto, o segredo está no equilíbrio constante, ao invés de mudanças rápidas e extremas. Por exemplo:
Sabia que 1kg de gordura corporal equivale a cerca de 7.000 calorias? Isso significa que, para ganhar ou perder 1 kg de peso corporal, seria necessário consumir 7.000 calorias a mais ou a menos do que o seu corpo gasta normalmente. Agora, imagine que 7.000 calorias podem ser representadas por:
Ao fazer estes cálculos, fica claro que perder ou ganhar peso não se trata apenas de uma refeição ou de um único dia de escolhas alimentares. Manter o equilíbrio é o segredo para um estilo de vida saudável. Portanto, é importante focar em hábitos alimentares equilibrados a longo prazo, e não em dietas drásticas.
Menos calorias não é sempre melhor
Reduzir drasticamente as calorias pode levar a um emagrecimento rápido, mas o que realmente está a acontecer é que o corpo está a passar por um processo de “fome”. Uma dieta de 1.200 calorias por dia (que muitas vezes é recomendada para quem procura emagrecimento rápido) equivale a muito poucos alimentos diários, sendo metade do valor basal referencial para um corpo adulto.
Isto é muito pouco para o corpo quando num registo contínuo e sem o devido cuidado, pois é insuficiente para o seu funcionamento adequado e pode levar à perda de músculo, desaceleração do metabolismo – particularmente o cerebral – e às referidas dificuldades cognitivas, afectando significativamente a nossa consciência, percepção e emoções. O resultado pode ser a redução da energia e da disposição para as actividades diárias, a relação disfuncional com a comida e o subsequente aumento do risco alimentar compensatório e obsessivo.
O Prato Equilibrado
Em vez de focar apenas nas calorias ou em cortar completamente certos alimentos, a chave está em garantir um prato equilibrado e que atenda à realidade nutritiva da pessoa, seja pelas hipotéticas alergias ou intolerâncias que tenha, comprometimentos alimentares decorrentes de estados de saúde ou mesmo uma questão tão simples quanto o biótipo do corpo da pessoa, de modo a que a pessoa não sinta fome extrema, mantenha um nível constante de energia e, mais importante, mantenha a saúde e a satisfação com a alimentação. Um prato equilibrado deve conter:
O Exercício Físico
Exercícios físicos são essenciais para a saúde, mas devem ser praticados de forma equilibrada. O objectivo do exercício não deve ser o de compensar excessos alimentares, mas sim manter o corpo em movimento, fortalecer a musculatura e melhorar a saúde cardiovascular. Exercícios exagerados ou que envolvem práticas extremas podem, de facto, desencadear problemas de imagem corporal e alimentação.
Seja consciente e esteja informado. O Que Realmente Importa?
Ao adoptar hábitos alimentares saudáveis e práticas de exercício com equilíbrio, você está a evitar a armadilha das dietas extremas e da obsessão pelo corpo perfeito, passando a focar em como se sente no seu corpo, no seu bem-estar e na sua saúde mental.
A mudança começa dentro de nós. O caminho para uma vida mais saudável, equilibrada e feliz inicia-se com uma decisão simples: cuidar de si mesmo, de si mesma, sem obsessões, sem pressões externas, mas com respeito e consciência. Liberte-se das armadilhas dos padrões irreais e das dietas extremas. A verdadeira saúde não se mede no corpo perfeito, mas sim no corpo que tem e no bem-estar que constrói ao cuidar dele com equilíbrio.
Lembre-se: cada escolha que você faz hoje pode ser o primeiro passo para transformar a sua vida. Priorize a saúde mental, emocional e física. Construa uma relação saudável com a comida, com o exercício e, principalmente, consigo mesmo. Não deixe que o medo ou a insegurança guiem as suas decisões. A mudança começa dentro de si.
Está nas suas mãos ser a melhor versão de si, agora. O que está à espera? Dê o primeiro passo em direção à verdadeira felicidade — a felicidade de se aceitar, de se cuidar e de viver com leveza. O caminho não é fácil, mas cada esforço vale a pena. E, se precisar de ajuda, saiba que não está sozinho nesta jornada. Juntos podemos construir um futuro mais saudável, equilibrado e feliz. A mudança começa agora — e ela começa consigo.
Na Learn2Be, temos uma equipa dedicada e preparada para trazer o melhor de si mesmo, ajudando a encontrar respostas para os seus dilemas e apoiar na sua jornada de transformação. Juntos, podemos ser melhores.
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