Um bigode à saúde mental

Neste mês de Novembro assinala-se o movimento Movember, que surgiu na Austrália, em 2003, à boleia da comemoração do dia mundial de combate ao cancro da próstata, realizado no dia 17 de novembro. Neste mês há movimentos que se organizam no sentido de promover uma consciencialização para doenças que afetam os homens como o cancro da próstata ou do testículo, assim como a promoção da necessidade de uma atenção maior à saúde mental nos homens, nomeadamente, a depressão, a ansiedade, o suicídio. Organizam-se assim dinâmicas, movimentos, concentrações, grupos de várias áreas desde a música, ao desporto, carros e motas em que os homens se apresentam vestidos de modo formal e de bigode como forma simbólica ao traço masculino culturalmente instalado.

A saúde física e mental são ainda hoje temas de difícil debate e abertura no geral mas em particular nos homens.

A imagem do corpo está ligada à representação mental que se faz independentemente da realidade. A imagem do bigode mostra isso mesmo, uma representação de masculinidade, o homem que atingiu a sua maturidade, virilidade e com isso uma idealização de segurança e força.  A imagem culturalmente instalada, muitas vezes inconsciente, de que o homem deve ser sempre uma muralha de segurança, certeza e firmeza prejudicam o rastreio de doenças físicas e dificultam a prevenção e atuação ao nível da saúde mental.

Saúde Mental Masculina

É por demais sabido que há uma maior repressão emocional nos homens do que nas mulheres. Em crianças, os rapazes vão ouvindo e interiorizando expressões como “um homem não chora” ou “mariquinhas pé de salsa” aludindo a um ser frágil, inseguro do qual se deve fazer troça e, em última instância, ser alvo de um não amor. Desde cedo, portanto, os rapazes vão sentindo que é esperado que sejam fortes, autónomos, “senhores” de si, e que a vulnerabilidade ou dependência do outro poderá não ser a melhor característica a demonstrar. Esta é uma das razões para que os pedidos de ajuda terapêutica tenham sido sempre, e ainda hoje seja, maior em mulheres, no entanto, regista-se uma tendência cada vez maior no encurtamento dessa diferença entre homens e mulheres, principalmente, na última década.

A consciencialização e o derrubar de crenças limitantes é crucial e tem sido feito um trabalho muito grande no que toca a desmistificar esta ideia de que o homem não é, nem pode ser, vulnerável e de que preocupar-se com a sua saúde física e psicológica não é esperado nem expectável.

Atuação na Saúde Mental dos Homens

O estigma ainda existente, embora menor que no passado, face à procura de ajuda por parte dos homens é uma das razões para os elementos estatísticos que apontam que os homens têm uma maior propensão ao suicídio. As emoções reprimidas e a dificuldade em pedir ajuda terapêutica de modo preventivo ou mesmo na incidência de problemas traz como principal problema o agravamento de sintomas. A identificação precoce é fundamental para prevenir problemas psicológicos nos homens.

Uma das principais queixas dos homens é a insónia e a irritabilidade. Também elas fruto da perpetuação de sintomas sem atuação devida em tempo apropriado. Com isso aumentam outros factores de risco à saúde mental, nomeadamente, o isolamento que favorece o aparecimento de quadros de depressão, ansiedade e em alguns casos, de suicídio.

Fatores de Sofrimento Masculino

São vários os factores de sofrimento psicológico nos homens. Destacam-se como principais os problemas de ordem sexual, o desemprego e as adições.

Depois aparecem as doenças graves que colocam em risco a autonomia da pessoa e favorecem o declínio da saúde mental. Os problemas de ordem sexual são um grande factor de risco para o aparecimento de complicações mentais e sofrimento psíquico acentuado por afetar diretamente a autoestima.

O desemprego pode ser um factor de grande angústia pelo facto da pessoa não sentir ter um papel e uma função social e, como tal, poder sentir-se com pouca utilidade. Este cenário, associado ao isolamento social e pensamentos de desesperança pode contribuir para o surgimento de problemas psicológicos e psiquiátricos.

Quanto às adições, o abuso de álcool e substâncias são comportamentos que causam inúmeros prejuízos, influenciando diretamente na resolução de conflitos de forma agressiva e podendo levar a situações recorrentes de violência e com isso a um ambiente destruturado na vida quotidiana da pessoa.

Estratégias para Melhorar a Saúde Mental dos Homens

Aumentar a consciencialização e trabalhar para reduzir o estigma é fundamental como estratégia de melhoria e promoção da saúde mental nos homens. Também é fundamental abordar as causas dos problemas de saúde mental nos homens.

Algumas das estratégias para essa melhoria passa por adquirir hábitos saudáveis de sono e de alimentação, e por mais simples que possa parecer, estes dois elementos de autocuidado, promovem, sem dúvida, a melhoria da saúde mental. São estratégias primárias que podem ajudar os homens a superar inúmeros problemas de saúde mental.

Outras estratégias incluem ativar recursos sociais onde possam pertencer a grupos de pessoas das quais se possam identificar e assim modelar novas formas de estar na vida. Recursos como a meditação e a atenção plena podem também ser aprendidos e desenvolvidos para ser implementados em hábitos diários que promovam o relaxamento e um maior autoconhecimento que ajuda a pensar e, como tal, a sentir melhor.

O desenvolvimento pessoal e o autoconhecimento são sem duvida elementos fundamentais para uma maior saúde mental.

Estas estratégias são de facto importantes para mitigar alguns problemas de saúde mental mas apenas funcionarão se os homens reconhecerem que precisam delas. E esse continua a ser o maior desafio à saúde mental nos homens: aceitar pedir ajuda e aceitar ser ajudado.

Oferecer um bigode à saúde mental é um ato de maturidade, inteligência e de saber pensar. Ter uma boa saúde mental é “d`homem”.

João Pedro Lagarelhos

Psicólogo Clínico e Coach, no Learn2be Algarve