
Todos nós já nos comparámos (ou ainda o fazemos) e também já sofremos com comparações. Para uns mais do que para outros, esta palavra assombra-nos a vida e pode mesmo tornar-se num sentimento devastador de lidar. Mas é possível lidar, é possível viver com esta palavra sem que nos ocupe demasiado espaço mental nem destrua a imagem que temos de nós próprios, e com a qual temos o poder de escolher viver.
Partindo desta certeza, de que é uma sensação comum e transversal a todo o ser humano, podemos desde já aceitá-la como natural da nossa experiência humana, enquanto seres sociais que vivem inseridos em comunidade. Este conhecimento de identificação global, pode ajudar-nos, por si só, a apaziguar um pouco qualquer dor que sintamos, pelo simples facto de sabermos que não somos os únicos a senti-la.
Por exemplo se estivermos a falar da esfera profissional (onde estão presentes muitos termos de comparações), o facto de uma pessoa ser reconhecida como bem-sucedida, não faz automaticamente com que outra seja uma nulidade no seu próprio trabalho. Quebrarmos este ciclo destrutivo de comparações, passa também por entendermos que o sucesso (em qualquer área da vida) de um não dita o fracasso do outro.
As comparações afetam-nos porque a cultura da escassez tem vindo, infelizmente, a ganhar cada vez mais terreno, desde muito cedo, na nossa mente, e através dos mais variados meios – educação, herança cultural, media, redes sociais, etc. Esta cultura incute-nos a ideia de que “não somos suficientemente bons” e que “não bastamos”. Comparamo-nos, tanto com pessoas próximas – a nossa amiga, o nosso irmão, o nosso colega de turma, o nosso chefe – ou com pessoas que nem conhecemos realmente, mas que fazem parte da nossa rede de “amigos sociais” e com os quais nos deparamos diariamente no nosso feed de instagram. De todos os lados surgem comparações, que vivemos intensamente, e nos fazem sentir que “não correspondemos às expectativas que o outro tem de nós (ou que temos de nós mesmos)”, que levam a sentimentos de cobrança para sermos mais e melhores em determinado aspeto da nossa vida (ou em todos).
Ao gerar também desmotivação e desalento, a comparação pode ser muito desgastante e destrutiva – sobretudo para a nossa confiança e segurança internas, para a imagem que construímos de nós próprios, para as crenças que formulamos sobre quem somos e, consequentemente, para a forma como pensamos e nos comportamos, quer connosco mesmos, quer com quem nos rodeia.
Vamos sempre viver com pessoas, em sociedade, o que implica o inevitável confronto com comparações que geram desconforto. Mas temos o poder de escolher como querermos e iremos lidar com a forma como estas nos afetam. Para isso, é importante começar a fazer escolhas diferentes, para assim alterar os contextos em que vivemos, e traçar um caminho mais confortável para todos. Da mesma forma que somos quem proporciona as comparações entre nós e os outros, também reside em nós o ponto de partida da capacidade para nos motivarmos, nos aceitarmos, para que assim possamos crescer e evoluir.
"Estamos formatados para nos compararmos. Não é uma escolha. A única coisa que é uma escolha é ter noção disso e escolher como vamos deixar que nos afete."
Bréne Brown
Claro que é legítimo que existam aspetos na nossa personalidade, aparência, relações, trabalho, hábitos, vida, sobre os quais não nos sentimos satisfeitos e que gostávamos que fossem diferentes. É válido e saudável, no sentido em que nos mostra que somos seres autocríticos e introspetivos, que refletem sobre o seu nível de satisfação, fora de uma dinâmica comodista. Sentirmos isto é sinal de que temos ambições, vontades e idealizações que, mais uma vez, só dependem de nós e das escolhas que fazemos. É da nossa responsabilidade. Por isso, quando detetamos um “problema” (neste caso, uma insatisfação), é importante que pensemos numa solução, isto é, num modo de resolver o que gostávamos que fosse diferente. De nada nos serve identificar, por comparação, algo que não nos deixa felizes, e depois não fazer nada por melhor ou evoluir em relação a esse aspeto.
Se se sente uma pessoa que se compara muito e que sofre por isso, convido-o a tentar olhar de um outro prisma, pois tudo isto tem a ver com o foco que escolhemos ter. Às vezes é preciso fazer “zoom-out” para percebermos onde nos estamos a focar e no que nos devíamos desfocar, para então efetivamente focar no que consideramos importante e, então aí, fazer de novo “zoom-in”. Infelizmente, passamos mais do nosso tempo com o foco no Outro – no que fazem, no que são, onde estão, com quem estão, o que têm – e de menos a pensar, realmente, em nós, no que fazemos, somos, queremos. Consequentemente, as opiniões externas pesam mais quanto mais peso lhes damos.
Este conceito pode ter duas direções: a comparação pela “positiva” e a comparação pela “negativa”. Cada uma defende diferentes formas de ver o que, mais uma vez, torna-se uma escolha de como querermos encarar esta inevitabilidade social. Por um lado, a comparação dita negativa consegue destruir-nos e corroer-nos, sobretudo pelo sentimento de inferioridade, insuficiência e desvalorização. Por outro lado, a comparação dita positiva, pode funcionar como catalisador de motivação e ambição, ao nos estimular para alcançarmos o que antes parecia impossível de ter, ser ou conseguir – questionando-nos, por exemplo: “Como posso melhorar?”, “O que preciso de fazer para conseguir aquilo?”, “Como me sinto em relação a isto?”.
(Nota: a comparação positiva, se encarada de forma desmedida, pode também, escalar para uma dinâmica tóxica, ao conduzir a sentimentos de constante insatisfação e insuficiência).
Nós próprios devemos ser as nossas principais referências para a comparação connosco mesmos. A intenção que deve reinar no nosso cérebro (e que sim, é possível educar) é a de ambicionarmos sermos melhores do que já fomos, fazermos mais do que fizemos, tentarmos o que ainda não conseguimos, ir aonde ainda não fomos, sermos quem sonhamos ser. Para conseguirmos alcançar esta consciência e espírito de mudança, é imprescindível desenvolvermos competências como o autoconhecimento. Desta forma conseguimos descobrir os valores com os quais nos identificamos e queremos seguir, quais os nossos sonhos, objetivos e ambições, limites e necessidades, bloqueios e impulsos. Permite-nos conhecer quem somos e vivermos de acordo com essa essência, sustentada por confiança, segurança e amor-próprio. Assim, mais facilmente conseguimos combater os sentimentos desconfortáveis que da comparação possam surgir. Compreendermos que somos seres únicos, com todas as idiossincrasias que o significa ser, conduz-nos a olharmos mais para dentro de nós próprios e menos para fora (para os outros). Passamos a bastar-nos e a sermos o nosso próprio barómetro de satisfação e felicidade.
Procure desenvolver a sua identidade pessoal, conhecer-se, refletir sobre quem quer ser e o que quer alcançar e trace um caminho de como o poderá fazer. É um processo que não é linear, que pode gerar também algum desconforto – mas não se consegue evoluir sem desconforto, não se consegue mudar sem sair do mesmo sítio. Um acompanhamento psicológico pode ajudá-lo neste sentido, a trabalhar o seu desenvolvimento pessoal e expandir a sua autoconsciência, em prol de um maior sentimento de satisfação e plenitude para a sua vida.