O Vasco tem 10 anos.
Estuda no 5º ano.
É um aluno muito aplicado, com nota 5 sobre 5 na maioria das disciplinas.
Fica extremamente zangado com ele próprio quando tem menos de 90% em algum teste.
Mantém a mesma rotina todos os dias da semana: assim que chega da escola faz os trabalhos de casa, que lhe ocupam uma a duas horas, sem se mexer da secretária no seu quarto.
Toma o lanche depois de feitos os trabalhos e, finalmente, pode ir fazer o que quiser até à hora de jantar.
Geralmente opta por ler um livro ou por pegar na bicicleta e dar uma volta pela vila.
Sente-se muito feliz nestes momentos.
Aliás, só se sente feliz nestes momentos.

Ler permite-lhe evadir-se da realidade e refugiar-se num mundo imaginário.
Andar de bicicleta permite-lhe reconstruir um mundo à sua medida.
Sentindo o vento na cara, girando os pedais cada vez com mais força, imagina estar longe dali, numa época diferente, em que ele é rei e senhor de todas as terras.
Quando chegam as férias de Verão, tendo à sua frente quase três meses de brincadeira, passa a maior parte do dia sozinho, mais uma vez entre os livros e a bicicleta.
O Vasco tem dois irmãos mais velhos, mas raramente brinca ou joga com eles.
Isola-se no seu quarto, onde reina a liberdade e a imaginação.
Ali a cama deixa de ser uma cama e passa a ser um arranha-céus.
O tapete deixa de ser um tapete e passa a ser um emaranhado de ruas e cruzamentos.
ALI TUDO É POSSÍVEL, TUDO PODE ACONTECER.
A ÚNICA COISA QUE NÃO PODE ACONTECER É SER ELE PRÓPRIO.
Sente que há alguma coisa de diferente nele. Percebe que não tem os mesmos interesses que os irmãos.
Não pode deixar que ninguém perceba essa diferença. Fecha-se cada vez mais sobre si próprio, fala cada vez menos.
Mesmo na escola, com os colegas, apercebe-se dessa diferença. Não encontra ninguém com quem possa falar do que sente.
Aliás, nem lhe passa pela cabeça que pudesse falar “daquilo” com alguém.
O Vasco tem agora 37 anos.
É nesta fase da vida que, pela primeira vez, procura acompanhamento psicológico.
Tem toda uma história para contar.
Confessa: “De tanto me isolar esqueci-me de perceber, ou de acreditar, que isto era possível, que podia falar de mim, que podia libertar-me deste peso”.
O Vasco é homossexual, tem uma relação amorosa estável há quatro anos.
É a sua primeira relação com uma pessoa do mesmo sexo.
O Vasco teve muitas namoradas.
Chegou, inclusive, a pensar em casar.

Relata: “Sentia-me completamente desajustado, como se houvesse dois Vascos a viver ao mesmo tempo.
Como se fosse uma fotografia desfocada, em que as duas imagens não se conseguiam sobrepor.
Um deles era o Vasco que fazia o que era esperado que fizesse, aquilo que os outros esperavam; e um outro Vasco que representava aquilo que, muito a medo, desejava realmente para a minha vida”.
Hoje compreende que muito daquele “tenho de fazer assim desta maneira” era mais fruto daquilo que ele imaginava que devia ser, e menos do que aquilo que eram as verdadeiras expectativas de quem o rodeava.
Lembra-se, como se fosse hoje das palavras dos pais e dos irmãos quando lhes confessou (palavra escolhida refletidamente pelo Vasco) ser homossexual:
“O que interessa é que sejas feliz”; “Tem cuidado com os outros, o que interessa é o que tu pensas e sentes, mas os outros, infelizmente, não são assim tão cuidadosos”; “Já sabia disso há muito tempo.
“O que interessa é que sejas feliz”; “Tem cuidado com os outros, o que interessa é o que tu pensas e sentes, mas os outros, infelizmente, não são assim tão cuidadosos”; “Já sabia disso há muito tempo.
Porque é que não falaste antes?”; “Quando estiveres com alguém apresenta-nos essa pessoa, vamos todos sair juntos”.
Foi nesse momento que a sensação de desajustamento desapareceu.
Relata: “Houve um choque inicial, claro.
Foi tão estranho, bom e estranho ao mesmo tempo.
Aquelas duas imagens que não se conseguiam sobrepor, aqueles dois Vascos desfocados, encontraram-se pela primeira vez.

Parecia que tinha passado anos a ver-me, a mim próprio, desde o alto, fora do meu corpo, como se observasse alguém ali em baixo a utilizar o meu corpo, a viver uma vida que não era a que eu queria”.
A opção que fez pelo acompanhamento psicológico tem-lhe permitido expurgar muitos dos sentimentos negativos que carregou durante anos:
– Culpa: “Bem sei que é uma idiotice, agora vejo isso, mas naquela altura não percebia. O que me atormentava, quando era mais novo, é que não ia dar netos aos meus pais”;
– Inferioridade: “Era como se me faltasse alguma coisa, alguma coisa estava errada em mim, os outros estavam bem, eram normais, eu não era”;
– Insegurança: “Sentia os olhares sempre pousados em mim. Claro que sei agora que era ilusão, mas qualquer coisa que eu fizesse ou dissesse, tinha de pensar bem antes”.

Relata: “Foram anos a esconder mas, no fundo, o que eu estava a esconder não era o facto de gostar de rapazes, estava a esconder a minha pessoa, estava a proibir-me a mim próprio de viver a vida que me estava destinada, de aproveitar essa vida da melhor maneira possível”.
Continua: “Se tivesse tido alguém com quem falar destas coisas todas quando era mais novo, talvez tivesse facilitado a minha vida. Talvez me tivesse sentido mais igual aos outros”.
Este é o relato de uma história possível, entre tantas outras que conhecemos.
É a história do nosso filho ou da nossa filha, do nosso colega de trabalho, do nosso melhor amigo ou amiga.
É a nossa própria história.
O ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO E PSICOTERAPÊUTICO TEM AQUI, MAIS UMA VEZ, UM PAPEL IMPORTANTE:
- Contribui para uma melhor compreensão de si próprio, da pessoa que é e daquilo que realmente deseja para a sua vida;
- Promove o aumento de consciência e a construção de uma realidade diferente da anterior, tida como difícil ou irresolúvel;
- Facilita a regulação cognitiva e emocional de uma forma adaptativa e potenciadora de bem-estar;
- Apoia na reescrita de uma vida cheia de potencial, onde o limite é a pura imaginação.
Gonçalo Duque Plaza
Psicólogo Clínico / Hipnoterapeuta
Psicólogo Clínico / Hipnoterapeuta